Começo por saudar respeitosamente todos os subscritores da petição “Português para Todos” e a relevância da sua intenção em pretender reforçar o Ensino de Português no Estrangeiro, um pilar central da promoção da Língua portuguesa no mundo e da ligação ao país.

Consideramos, no entanto, que os argumentos utilizados não colam com a realidade das nossas comunidades nem com a ambição que a Língua portuguesa tem hoje enquanto Língua de projeção global, conforme expomos no nosso Projeto de Resolução.  Importa, por isso, esclarecer algumas questões levantadas nas iniciativas legislativas de vários grupos parlamentares, que em nossa opinião em nada contribuem para a valorização da Língua portuguesa no estrangeiro, que está integrada num todo coerente que vai do ensino pré-escolar ao universitário, sob a tutela do Instituto Camões, que é quem tem melhores condições para garantir a adaptação eficaz dos cursos às diferentes realidades em que estão inseridos.

Dizer que o EPE está à beira da extinção ou que tem havido na última década uma desvalorização e um desinvestimento, não corresponde de forma alguma à verdade nem beneficia a promoção e a imagem da Língua portuguesa. Com os governos do PS, a Língua e o Ensino de Português no Estrangeiro sempre foram e sempre serão um vetor central da política externa portuguesa, em que a expansão da rede e a melhoria das condições de professores e alunos será sempre uma prioridade.

Consideramos também errado que se atribua à mudança da tutela para os Negócios Estrangeiros e ao novo regime jurídico do EPE, de 2006, os supostos problemas no ensino. Não é assim. Houve, de facto, uma mudança de paradigma, mas num sentido que nos deve orgulhar, porque a Língua portuguesa começou a deixar de ser vista como uma língua de emigração para ocupar o lugar que merece por direito próprio, a quarta mais falada no mundo, a mais falada no hemisfério sul, falada em todos os continentes e língua de trabalho em três dezenas de organizações internacionais e presente na rede EPE em 17 países.

A mudança de tutela e o novo regime jurídico trouxeram mais ambição e rigor ao EPE e uma intervenção de proximidade através das embaixadas e consulados, o que tem permitido um melhor acompanhamento das diversas modalidades de ensino, do paralelo ao integrado, do complementar ao associativo, e maior capacidade de resposta às realidades e necessidades no terreno. A adoção do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas, elaborado pelo Conselho da Europa, não veio estrangeirar os jovens portugueses nem anular o ensino em Língua materna, mas sim trazer mais qualidade pedagógica e reforçar a importância da certificação dos cursos enquanto instrumento fundamental de valorização dos percursos académicos e profissionais.

O pior mesmo é a quase xenofobia sem sentido que refere que os cursos são dirigidos a alunos estrangeiros e que os portugueses são discriminados, só porque houve uma redução do número de alunos nos cursos paralelos no período da troika. Não apenas é falso, como a língua portuguesa não deve ficar presa no gueto da Língua materna, o que seria uma forma de, aí sim, criar dificuldades à formação dos cursos por escassez de alunos e afastá-la da realidade concreta das nossas comunidades, onde os níveis de desempenho linguístico variam enormemente em função do contexto familiar e que os professores sabem muito bem gerir na sala de aula.

Reproduzir nos dias de hoje uma ideia de ensino para emigrantes como havia nos anos 70 e 80, é condenar a Língua à irrelevância e esmagar todo o potencial económico, político e cultural que a partir do início deste século foi consolidando.

Nem sequer nos parece correto associar a introdução da propina à redução do número de alunos no EPE, em má hora introduzida durante a crise pelo Governo do PSD/CDS, visto que assim se está a esconder um problema sério que então existia de inflação do número de alunos inscritos por turma, havendo milhares que na realidade nunca frequentavam os cursos, situação que terminou quando o registo passou a ser transparente. Quanto à propina, a nossa posição é a que consta do programa de Governo: reduzir progressivamente os encargos com o EPE e é isso que vamos procurar garantir que aconteça até final da legislatura.

A prova que não existe desinvestimento, é que os cerca de 17 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência vão integralmente para promover a modernização do ensino paralelo, com novos conteúdos e outros materiais pedagógicos, adaptando melhor os cursos ao perfil dos alunos com uma utilização mais abrangente das tecnologias digitais, contribuindo para preparar melhor os jovens para o futuro e para integrar mais facilmente nos cursos aqueles que de outra forma ficariam de fora porque vivem em regiões mais isoladas, para participarem por via remota, sempre numa lógica de complementaridade.

Paulo Pisco

Intervenção no debate sobre a petição “Português para Todos” e diversas iniciativas legislativas sobre o Ensino de Português no Estrangeiro

In bomdia.lu

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